Na verdade, a famosa rotunda da Boavista, assim apelidada por todos os portuenses, é a praça Mousinho de Albuquerque. Mas... um segredo... shiu... quase ninguém na cidade o sabe!!!
É nesta rotunda que se encontra o Monumento aos Heróis das Guerras Peninsulares, o normalmente designado monumento da Rotunda da Boavista.
E, não, o Leão e a Águia nada tem a ver com o futebol, provocações futebolísticas à parte, regressemos ao famoso Monumento. É, talvez, o mais famoso da cidade do Porto. Se é verdade que os Monumentos não se medem aos palmos, tal como as pessoas, os 45 metros de altura deste fazem dele uma presença imponente e incontornável no perfil da cidade. Atrevo-me a dizer que rivaliza com a Torre dos Clérigos, o edifício da Câmara Municipal e até a Casa da Música, tão futurista e mesmo ali ao lado.
Obra do Arquitecto José Marques da Silva (1869-1947) e do Escultor António Alves de Sousa (1884-1922) para além de ser o maior Monumento da Cidade foi o que mais tempo demorou a ser construído, quase 50 anos. Sim, quase meio século entre o projecto (1908) e a inauguração (1952). Demorou tanto a sua construção que, infelizmente os seus autores não o viram terminado em suas vidas.
A ostensiva monumentalidade de “O povo e Tropa” assim designado pelos seus autores, tinha tudo para ser um monumento ímpar na cidade do Porto. É bom lembrar que, à data, Marques da Silva era já uma figura incontornável sendo por muitos considerado o “Arquitecto da Cidade”, sublinha-se que é dele o projecto do Teatro Nacional de São João do Porto e a famosíssima estação de São Bento.
O seu Escultor, quase um ilustre desconhecido, terá sido um protegido da mulher de Marques da Silva e talvez, por esse facto, para além do seu enorme talento, escolhido para esculpir o Monumento.
De louvar a visão de futuro, nomeadamente a preocupação de o adequar ao lugar destinado, uma rotunda, que já na altura era um radial de confluência de 7 vias.
Começando por ponderar um arco do triunfo, tão na moda à época, inovaram e optaram por um leão e uma águia simbolizando a força e determinação do exército luso-britânico a subjugar a águia napoleónica. No restante grupo escultórico figuram a Pátria numa mulher – Vitória - guiando o levantamento do povo, cenas dramáticas da invasão do Porto pelo exército do General Soult e um quadro icónico da tragédia da ponte das Barcas, por último, imortaliza os líderes militares nas figuras de quatro dos seus comandantes.
Marques da Silva, na sua tão característica genialidade, erigiu o monumento central, com o peso visual na base e a delicada silhueta da coluna sobre a cidade. Dessa forma, acautelava os valores de perspectiva múltipla e instaurava uma nova tipologia de monumento.
Vários revezes sofreu a obra, a morte prematura do seu Escultor António Alves de Sousa, polémicas com os fiscais da obra e a sempre comum, falta de dinheiro.
A construção entra numa fase insustentável, os tempos mudaram e uma nova concepção artística surgiu, o projecto é considerado datado e incongruente. As ervas daninhas e vegetação cresce de tal maneira ao redor da construção que a imagem de degradação é motivo de chacota na cidade do Porto. Rapidamente foi apelidado de “castiçal” da Boavista. Em 1933 surgem propostas na Câmara Municipal para a sua demolição. Mais uma vez, a imprensa teve um papel preponderante e é, a ela que devemos a existência deste Monumento, ao defender e expressar a continuidade da obra. Paralelamente a tudo isto, a derrapagem, também ela monumental, do orçamento para a construção deste magnífico exemplar escultórico. Há coisas que não mudam em Portugal.
A Henrique Moreira caberia fazer as esculturas idealizadas pelo Alves de Sousa no sopé e a Sousa Caldas o grupo Leão-Águia. Assim continuou a obra.
Em 1947, outro duro revés, a morte de Marques da Silva que não chega a ver a sua obra terminada.
Em 1952, finalmente, o monumento é finalizado e a sua inauguração a 27 de Maio contou com a presença do Senhor Presidente da República Craveiro Lopes.
A cidade do Porto tinha o seu Monumento aos Heróis das Guerras Peninsulares e com o tempo ganhou o seu ex-libris.
Obra esteticamente fora do seu tempo, mas que sem dúvidas, assentou bem no local para o qual foi destinado.
A fazer quase 70 anos de existência é pelos portuenses admirado e estimado sendo um dos monumentos mais queridos da cidade do Porto.
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